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Do Silêncio à Cura- Dalton Paula

Do universo de cores e mitos de Os Cavaleiros do Zodíaco surgiu meu desejo, meu encanto pela pintura. Aos quatorze anos, eu copiava esses desenhos de herói usando papel-carbono e os coloria com lápis de cor. Hoje percebo que a qualidade estética desse desenho animado (uma mistura das mitologias grega e nórdica) foi minha porta de entrada para as artes.

Pouco tempo depois ingressei na Escola de Artes Visuais em Goiânia e dei início aos meus estudos de pintura. Nas aulas, aos poucos foram surgindo os traços do que atualmente fundamenta o meu trabalho artístico: o corpo. 

O corpo negro, corpo silenciado pelo medo, pela insegurança, pela individualidade e pela efemeridade. As referências nas quais busco esse corpo – aliás, esses corpos negros – são os subúrbios, as congadas e os terreiros e ritos das religiões de matriz africana. 

São Benedito é Preto, Papai, 

Eu também sou Preto, mamãe,

Essa festa é de Preto, papai

Oh! Virgem do Rosário!

Esse trecho de uma música cantada no terno de congo 13 de Maio da Vila Mutirão, em Goiânia, confirma minha escolha por tais espacialidades negras, nas quais os mitos são revividos, ressignificados; onde pessoas comuns se tornam reis e rainhas de Congo e renovam sua fé na religiosidade afro-brasileira que agrega santos católicos e divindades africanas, que contempla o sagrado em música e dança, em corpo e movimento.

Nas reflexões que proponho com meu trabalho, o corpo é o elemento central, e é partir desse corpo individual que busco atingir o coletivo. 

Uso o silêncio para comunicar, para despertar o que me incomoda, para repensar as imagens que aprisionam e abrir margens para reapresentar esses corpos negros em outras histórias, em outras estruturas, capazes de reconhecer o protagonismo de sujeitos que historicamente são silenciados. 

Essas narrativas ainda precisam ser ditas, escritas, contadas, representadas. Esse desafio me instiga a trabalhar e assumir (ou seria continuar?) essa missão iniciada em tempos remotos que não alcanço na memória, empreendida por aqueles e aquelas que vieram antes e abriram caminho…